A violência

Renan Sá
1 min readFeb 8, 2024

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Este quarto está vazio. Uma cama e um aparelho de rádio. Do lado de fora, um sol irritadiço, comum no sertão. Um sol furioso, que provoca erupções na pele e, mais tarde, dirige a sua fúria ao meu avô. A cadeira de balanço na sala emana um ruído, produzindo um eco em todos os cômodos da casa, desabitados. É uma casa sozinha e suspensa no espaço, vazia, já que a gravidade expele a maioria dos seus móveis e objetos. Nesta casa vazia ainda reside uma família. Sei disso porque ouço a água. Não isolada. Um som de água que bate num tanque, um som de líquido torcido, que escorre nas mãos de minha avó. Ouço a água sem refresco. Ouvir a água piora as erupções na nossa pele. E o pior é reconhecer que sigo preso à cama deste quarto vazio. Mais, que este lençol, fino, frágil e imundo, quase translúcido, é responsável por todos os líquidos que permeiam a casa, embora o meu suor não seja suficiente para matar a sede da família. A transpiração, envolta na cólera do sol, não nos serve de nada. A mistura homogênea da transpiração e da cachaça de gengibre nos provoca certa aversão e, ainda assim, as lágrimas que derrubamos possuem o odor e o sabor da nossa miséria. São líquidos escassos os desta casa. O gosto mais acentuado é o da terra seca.

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